10.1 EQUAÇÕES GOVERNANTES
Três princípios de conservação são aplicáveis no escoamento de canais:
O fluxo gradualmente variado estável combina as condições de conservação constante da massa e conservação de energia (Capítulo 7). O fluxo gradualmente variado instável combina as condições de conservação instável da massa e conservação do momento (Tabela 10-1). Assim, o fluxo gradualmente variado instável difere do fluxo gradualmente variado estável em sua descrição da variação temporal das variáveis de fluxo (vazão, estágio, profundidade do fluxo, velocidade média e assim por diante). Na prática, o fluxo gradualmente variado estável é simplesmente chamado de "fluxo gradualmente variado" (FGV), enquanto o fluxo gradualmente variado instável é geralmente chamado de "fluxo instável" (FI).
A Fig. 10-1 mostra as forças que atuam em um volume de controle. Uma força corporal e duas forças superficiais são mostradas. A força do corpo é o componente da força gravitacional resolvida ao longo da direção do movimento (W sin θ). As forças da superfície são: (1) a força devida ao gradiente de pressão (devido à diferença nas profundidades do fluxo), P2 - P1 e (2) a força desenvolvida ao longo do limite inferior devido ao atrito (Ff). Quando essas três forças estão em equilíbrio ao longo da direção do movimento, o fluxo é constante no ponto de vista da força. Quando as três forças NÃO estão em equilíbrio ao longo da direção do movimento, o fluxo é instável e uma quarta força surge (a força da inércia) para produzir um equilíbrio.
Equações principais A derivação das equações principais do fluxo instável (Fig. 10-2), também denominado de fluxo variado gradualmente instável ou das equações de águas rasas (Liggett, 1975), considera as declarações de conservação de massa e momento em um volume de controle (Fig. 10-3).
A declaração de conservação de massa é:
Para um canal de largura unitária (Liggett, 1975):
Simplificando e ignorando os termos de segunda ordem como Δx → 0:
A equação 10-3 é a equação de conservação instável da massa, geralmente chamada de equação de continuidade. No entanto, seu nome completo é: a equação diferencial de continuidade da água. Para fluxo estável: ∂h/∂t = 0 e Eq. 10-3 reduz para: q = uh = constante. Em geral, para um canal da área de fluxo A, a equação de continuidade da água constante é: Q = uA = constante. A declaração da conservação do momento é:
O momento, por unidade de largura do canal, é: ρ u (uh). Portanto, a taxa líquida de momento que entra no volume de controle FΔ (força por unidade de largura) é:
As forças que atuam no volume de controle, resolvidas ao longo da direção do movimento, são: (1) força gravitacional, (2) força do gradiente de pressão e (3) força de atrito (Fig. 10-1). A força gravitacional, por unidade de largura, é:
A força do gradiente de pressão, por unidade de largura, desenvolvida ao longo dos lados do volume de controle, é:
A força de atrito, por unidade de largura, desenvolvida ao longo do fundo do canal, se assemelha à força gravitacional, mas é oposta ao sinal:
Em que: Sf = declividade do atrito. [Como exceção dos canais de declive adverso do fundo, para os quais So < 0, as forças gravitacionais e de atrito são do mesmo sinal].
O tamanho do volume de controle, por unidade de largura, é:
A conservação do momento é:
Substituindo as Eqs. 10-4 a 10-8 na Eq. 10-9:
Simplificando a Eq. 10-10:
A equação 10-11 está em forma de conservação. Para certas aplicações, ele deve permanecer nesse forma. No entanto, muitas vezes é expresso de forma reduzida, operando com derivativos:
O segundo e o terceiro termo da Eq. 10-12 implicam nelas a equação de continuidade (Eq. 10-3). Assim, a Eq. 10-12 se reduz para:
Dividindo por g, a Eq. 10-13 é expressa em unidades de declividade:
A equação 10-14 é chamada de equação do movimento. É expressa em termos de declividades da seguinte maneira:
Em que : Sa = declividade da aceleração local; Tipos de onda
A equação 10-15 indica que o balanço do momento é essencialmente um balanço de declividades. No caso geral, quando todas as forças estão presentes, todas as declividades estão atuando e a solução é a mais geral. Em certos casos, no entanto, uma ou mais declividades podem ser reduzidas a zero ou consideradas desprezíveis (em comparação com as demais declividades).
10.2 SOLUÇÃO LINEAR
As equações 10-2 e 10-14 são as que governam a continuidade e o movimento, também conhecidas como equações de Saint-Venant (Saint-Venant, 1871). Elas são repetidas aqui por conveniência, como sendo as Eqs. 10-16 e 10-17, respectivamente.
Essas equações constituem um conjunto de duas equações diferenciais parciais não lineares (na verdade, quase-lineares), que quando combinadas adequadamente, resultam em uma equação diferencial parcial de segunda ordem do tipo hiperbólico, apresentando duas soluções. Até esta data, não há solução analítica de forma fechada do conjunto de Eqs. 10-16 e 10-17. Uma solução aproximada pode ser obtida linearizando o conjunto de equações e usando as ferramentas de análise de estabilidade linear (Ponce e Simons, 1977). A inclinação de atrito Sf está diretamente relacionada à tensão de cisalhamento inferior τ pela expressão (semelhante à Eq. 6-16):
De modo usual nos cálculos de estabilidade, as Eqs. 10-16 e 10-17 devem satisfazer o fluxo não perturbado, para o qual u = uo , h = ho , e τ = τo. Eles também devem satisfazer o fluxo perturbado, para o qual u = uo + u' , h = ho + h' , e τ = τo + τ'. O sobrescrito ' representa uma pequena perturbação no fluxo uniforme e constante. Assim, todos os termos quadráticos nos componentes flutuantes podem ser negligenciados devido a um raciocínio de ordem de magnitude. Substituindo as variáveis de perturbação nas Eqs. 10-16, 10-17 e 10-18, ocorre a linearização (Lighthill e Whitham, 1955):
Em que:
A tensão de cisalhamento limite τ pode estar relacionada à velocidade média u da seguinte maneira (Eq. 5-3):
Em que, o fator de atrito f é (Eq. 5-12):
Tendo em vista a Eq. 10-22, a Eq. 10-20 é convertida em:
Análise de pequenas perturbações A solução para uma pequena perturbação na profundidade do fluxo é postulada da seguinte forma exponencial (Ponce e Simons, 1977):
Em que: o subscrito * indica as variáveis adimensionais; Assim sendo:
Em que: βI* = factor de propagação de amplitude; No canal, o fluxo uniforme apresenta queda de carga igual à sua profundidade:
O distúrbio de profundidade está associado a um distúrbio de velocidade da forma:
A substituição das Eqs. 10-25 e 10-31 nas Eqs. 10-19 e 10-24 produz o conjunto:
No qual:
As equações 10-32 e 10-33 constituem um sistema homogêneo de equações lineares nas incógnitas u* e h*. Para que a solução não seja trivial, o determinante da matriz do coeficiente deve desaparecer. Portanto, a seguinte relação é válida:
A equação 10-35 é a equação característica que governa a propagação de ondas de águas rasas de pequena amplitude . Através da manipulação algébrica, a Eq. 10-35 é reduzida para:
A solução da Eq. 10-36 é (Ponce e Simons, 1977):
No qual:
As equações para celeridade adimensional e atenuação para as ondas primárias e secundárias são:
No qual:
A celeridade relativa da onda sem dimensão é:
A Fig. 10-4 mostra um gráfico da velocidade relativa sem dimensão da onda cr* versus o número de onda adimensional σ*. A Fig. 10-5 mostra um gráfico do decremento logarítmico da onda primária -δ1 versus o número de onda adimensional σ*, aplicável aos números de Froude F < 2. A Fig. 10-6 mostra um gráfico do incremento logarítmico da onda primária +δ1 versus o adimensional número de onda σ*, aplicável aos números de Froude F < 2. Com base nessas figuras, as características das ondas rasas serão descritas no quadro a seguir.
10.3 ONDAS CINEMÁTICAS
Uma onda cinemática é uma idealização (de fluxo instável de canal aberto gradualmente variado) que negligencia os termos de aceleração (local e convectivo) e o termo de gradiente de pressão (Tabela 10-2). Negligenciando estes termos, a equação de movimento (Eq. 10-14) é reduzida a uma declaração de fluxo uniforme e constante:
A instabilidade do fenômeno, no entanto, é preservada através do termo variável no tempo na equação de continuidade (Eq. 10-3). A combinação das equações Eqs. 10-3 e 10-49 dão origem à equação da onda cinemática. A partir de q = uh, a Eq. 10-3 pode ser expressa em termos de descarga na largura da unidade:
Em termos de descarga Q, a equação de continuidade é:
Uma declaração de fluxo uniforme (Eq. 10-49) pode ser adequadamente representada pela classificação da área de descarga:
Em que: α e β são coeficientes e expoentes, respectivamente. O coeficiente β varia em função do tipo de atrito, da forma da seção transversal e da inclinação do fundo. O expoente β varia em função do tipo de atrito e da forma da seção transversal. Assumindo, por uma questão de simplicidade, que α e β são independentes de A, a partir da Eq. 10-52 tem-se que:
Em que: V = Q / A = velocidade média. A equação da onda cinemática é obtida combinando as Eqs. 10-51 e 10-55 para produzir:
Em termos de descarga por largura da unidade q:
Celeridade convectiva A equação 10-56 (ou Eq. 10-57) é uma equação diferencial parcial de primeira ordem. Descreve a convecção da quantidade Q (ou q) com a velocidade convectiva ou celeridade ck, que corresponde a:
Dada a Eq. 10-55, a velocidade convectiva também pode ser expressa como:
Dado que dA = T dy (Eq. 3-11), onde T = largura superior do canal e y = estágio, a velocidade convectiva também pode ser expressa da seguinte forma:
A equação 10-60 foi originalmente derivada de Kleitz (1877) e mais tarde foi descoberta a partir de observações reais de campo por Seddon (1900). É frequentemente referida como Lei de Kleitz-Seddon, ou simplesmente Lei de Seddon. A equação 10-58 é usada quando β é conhecido. Já a Eq. 10-59 é usada em formulações teóricas, e a Eq. 10-60 em aplicações práticas. Já que a Eq. 10-56 é uma equação diferencial parcial de primeira ordem, ela não permite a difusão das ondas (atenuação ou dissipação das ondas). A difusão só pode ser obtida através de um termo de segunda ordem. Sob a suposição de linearidade (celeridade convectiva constante), uma onda cinemática tornará a sua vazão convectiva e sem difusão de onda; isto é, a vazão manterá a sua forma e permanecerá constante no espaço e no tempo após a propagação.
Choque cinemático Quando a suposição de linearidade é relaxada, a onda cinemática pode mudar de forma tornando-se (a) mais íngreme [Fig. 10-7 (a)] ou (b) mais plana [Fig. 10-7 (b)]. O fato de uma onda ficar inclinada ou achatada dependerá em grande parte da forma da seção transversal do canal. Dois limites assintóticos são reconhecidos: (1) ondas que se propagam em canais hidraulicamente amplos, enquanto (2) ondas que se propagam em canais inerentemente estáveis (Capítulo 1). Nos canais hidraulicamente amplos, as ondas se inclinam, enquanto nos canais inerentemente estáveis, elas se achatam (Ponce e Windingland, 1985).
Quando permitida a continuidade sem ser monitorada, a inclinação resulta em uma onda cinemática que se torna um choque cinemático . Assim, um choque cinemático é um recurso instável de fluxo de canal aberto intrinsecamente relacionado à onda cinemática: uma onda deve ser cinemática antes que possa se transformar em um choque cinemático (Lighthill e Whitham, 1955). Kibler e Woolhiser (1970) procuraram esclarecer a ocorrência de fenômenos de choque cinemático, afirmando:
Assim, o choque cinemático é real, mas raro, no mundo físico, onde as irregularidades espaciais se manifestam como difusão, com o efeito líquido de impedir o desenvolvimento do choque. Por outro lado, é provável que o mundo computacional seja muito mais regular, inibindo assim a difusão e promovendo o desenvolvimento de choque "numérico". Celeridade das ondas cinemáticasA celeridade relativa da onda cinemática, ou seja, a celeridade da onda cinemática tomada em relação à velocidade do fluxo, é:
Além disso, a celeridade relativa da onda cinemática sem dimensão é:
De acordo com a Eq. 1-11, a celeridade relativa da onda cinemática adimensional é:
Assim, para V = 1, ou seja, para um fluxo neutro e estável, o número de Froude é:
A Table 10-3 mostra a variação de: (a) o expoente β, (b) a celeridade relativa da onda cinemática adimensional cdrk e (c) o número de Froude com estabilidade neutra, com tipos selecionados de atrito e formato da seção transversal.
As seguintes conclusões podem ser obtidas a partir da Table 10-3:
Observe que o valor de β pode ser menor que 1 para casos diferentes dos mostrados na Tabela 10-3; por exemplo, quando a seção transversal não cresce monotonicamente com o estágio, como no fluxo circular do bueiro. Além disso, observe que, como o número de Froude possui um limite superior (correspondente a um limite inferior realisticamente alcançável no atrito do fundo), o valor Fns = ∞ tem um valor prático limitado. Se o número máximo de Froude atingível é conservadoramente Em resumo, as ondas cinemáticas têm as seguintes propriedades:
Classificação de ondas cinemáticas As ondas cinemáticas são baseadas em uma classificação de área de descarga de valor único,segundo a Eq. 10-52. Assim, uma classificação de onda cinemática é de valor único, exibindo uma correspondência individual entre (a) vazão, e (b) área, profundidade ou estágio do fluxo. Uma classificação de ondas cinemáticas é calculada usando uma fórmula de fluxo uniforme, como Manning ou Chezy, para uma faixa de (a) profundidades de fluxo, em canais artificiais, ou (b) estágios de fluxo, em canais naturais. Aplicação das ondas cinemáticasUma onda cinemática é um tipo simplificado de onda, em que três termos na equação de movimento (Tabela 10-2) foram negligenciados ou assumidos como sendo muito pequenos para ter algum significado prático. Assim, a onda cinemática não se aplica ao caso geral. Seu uso é recomendado para casos em que a instabilidade do fluxo é relativamente pequena. Na prática, uma onda cinemática será aplicada desde que a seguinte desigualdade sem dimensão seja satisfeita (Ponce, 1989; Ponce, 2014):
Em que: tr = tempo-de-ascensão do hidrograma; 10.4 ONDAS DIFUSIVAS
Uma onda de difusão é uma idealização que negligencia ambos os termos de aceleração na equação do movimento (Tabela 10-2). Desprezando-se estes termos, a Eq. 10-14 é reduzida para a seguinte declaração:
A instabilidade do fenômeno, no entanto, é preservada por meio do termo variável no tempo na equação de continuidade (Eq. 10-3). A combinação das Eqs. 10-3 e 10-68 dão origem à equação da onda de difusão. A equação da onda cinemática foi derivada usando uma declaração de fluxo uniforme constante em vez da equação do movimento (Seção 10.4). Na derivação da equação da onda de difusão, uma declaração de fluxo não uniforme constante (a declividade do atrito é igual à declividade da superfície da água) é usada (Fig. 10-8). Nesse caso, a classificação da área de descarga, usando a fórmula de Manning em unidades SI (Eq. 5-17), é:
Em que o termo entre parênteses indica a inclinação da superfície da água Sw.
A diferença entre as ondas cinemáticas e de difusão está no termo gradiente de pressão (dh/dx). Quando esse termo é incluído na formulação, a equação resultante é de segunda ordem e, portanto, é capaz de simular a difusão. Lighthill e Whitham (1955) se referiram a essa situação como a "difusão de ondas cinemáticas", isto é, um tipo de onda cinemática, ainda sem inércia em sua formulação, que é capaz de se difundir. Para derivar a equação da onda de difusão, a Eq. 10-51 é repetida aqui de uma forma ligeiramente diferente:
A equação 10-69 é expressa de uma forma mais conveniente (Cunge, 1969):
Em que m é o inverso do quadrado do transporte de canal K (Eq. 5-34), repetido aqui por conveniência:
A partir de dA = T dh, na qual T = largura do topo, a Eq. 10-71 passa a ser:
As equações 10-70 e 10-72 constituem um conjunto de duas equações diferenciais parciais que descrevem ondas de difusão. Essas equações podem ser combinadas em uma equação com Q como variável dependente. No entanto, é necessário primeiro linearizar as equações em torno dos valores de fluxo de referência. Por simplicidade, é assumida uma largura do topo constante (supondo um canal largo). A linearização das Eqs. 10-70 e 10-72 é realizada pela teoria das pequenas perturbações (Cunge, 1969). As variáveis Q, A, e m podem ser expressas em termos da soma de um valor de referência (com o subscrito o) e de uma pequena perturbação no valor de referência (com sobrescrito ' ): Q = Qo + Q' ; A = Ao + A' ; m = mo + m'. Substituindo-os nas Eqs. 10-70 e 10-72, desprezando perturbações ao quadrado e subtraindo o fluxo de referência, obtem-se:
e
Diferenciando a Eq. 10-73 em relação a x e Eq. 10-74 em relação a t resulta em:
Usando a regra da cadeia e a Eq. 10-73 segue que:
Combinando a Eq. 10-76 com a Eq. 10-77:
Combinando as Eqs. 10-75 e 10-78 e reorganizando os termos, obtem-se:
Por definição: mQ 2 = Sf (Eq. 10-70). Portanto:
E também
Substituindo as Eqs. 10-80 e 10-81 na Eq. 10-79, usando a regra da cadeia e eliminando os sobrescritos para simplificar, é obtida a seguinte equação:
O lado esquerdo da Eq. 10-82 é reconhecida como a equação da onda cinemática, com ∂Q/∂A como a celeridade da onda cinemática. O lado direito é um termo de segunda ordem (diferencial parcial) que explica o efeito da difusão física. O coeficiente do termo de segunda ordem possui as unidades de difusividade
A difusividade hidráulica, uma característica do fluxo e do canal, é definida da seguinte forma:
Em que qo = Qo /T é a vazão de referência por unidade de largura do canal. Da Eq. 10-83, conclui-se que a difusividade hidráulica é pequena para declividades íngremes do fundo (por exemplo, os de córregos das montanhas) e grande para declividades suaves (por exemplo, os de grandes rios próximos à foz).
A Equação 10-82 descreve o movimento das ondas de inundação de uma maneira melhor que a A Equação 10-82 é uma equação diferencial parcial parabólica de segunda ordem. Pode ser resolvida analiticamente, levando à solução de analogia de difusão para ondas de inundação (Hayami, 1951), ou numericamente com o auxílio de um esquema numérico para equações parabólicas. Uma abordagem alternativa é combinar a difusividade hidráulica (Eq. 10-83) com o coeficiente de difusão numérica do método de propagação de inundação de Muskingum (Seção 10.5). Essa abordagem é a base do método Muskingum-Cunge (Seção 10.6). Classificação de ondas de difusãoAs ondas de difusão não são baseadas na classificação da área de descarga com valor único. Assim, uma classificação de onda de difusão não é de valor único, exibindo um lasso (ou loop). De acordo com a Eq. 10-82, a celeridade das ondas de difusão deve ser a mesma que a celeridade das ondas cinemáticas (Ponce e Simons, 1977). No entanto, as ondas de difusão atenuam; portanto, a classificação real da área de descarga não é exatamente de valor único. Na prática, a celeridade das ondas de difusão é igual à celeridade das ondas cinemáticas apenas como uma aproximação. Aplicação das ondas de difusãoUma onda de difusão é um tipo simplificado de onda, em que dois termos na equação de movimento (Tabela 10-2) foram negligenciados ou assumidos como sendo muito pequenos para ter algum significado prático. Assim, embora a onda de difusão se aplique a uma gama mais ampla de casos do que a onda cinemática, ela ainda não é adequada ao caso geral. Seu uso é recomendado para casos em que a instabilidade do fluxo é de tamanho pequeno a médio (onde a onda permanece dentro de 30% da sua força original, em um período de propagação). Uma onda de difusão será aplicada desde que a seguinte desigualdade adimensional seja satisfeita (Ponce, 1989; Ponce, 2014):
Em que: tr = tempo-de-ascensão do hidrograma; As ondas de difusão aplicam-se a problemas de propagação de ondas de inundação (veja analogia de difusão de Hayami de ondas de inundação no quadro a seguir). Enquanto as ondas cinemáticas se aplicam às ondas de inundação que não se difundem, as ondas de difusão se aplicam às ondas de inundação que atenuam significamente. Enquanto a onda de difusão não responde pela propagação da onda, somente a onda cinemático-dinâmica mista (leia-se "onda dinâmica", Tabela 10-2) é capaz de resolver o problema corretamente. Na prática, no entanto, as ondas de difusão se aplicam a uma ampla gama de problemas de propagação de inundações.
Difusividade hidráulica dinâmica A difusividade hidráulica (Eq. 10-83) é uma propriedade fundamental das ondas de difusão. Ele afirma que o coeficiente de difusão é diretamente proporcional à descarga da largura da unidade e inversamente proporcional à declividade do canal. Esta conclusão é aplicável às ondas de difusão, que são governadas pela equação de convecção-difusão representada pela Eq. 10-82. Usando conceitos da teoria linear, Dooge (1973) desenvolveu uma equação de convecção-difusão usando a equação completa do movimento. A abordagem de Dooge estende o conceito de onda de difusão ao domínio das ondas dinâmicas (Tabela 10-2). Quando todos os termos são incluídos na formulação, a difusividade hidráulica é essencialmente dinâmica, expressa, para canais hidraulicamente largos, da seguinte maneira:
Ponce (1991) expressou a difusividade hidráulica dinâmica em termos do número de Vedernikov, da seguinte forma:
A equação 10-86 é totalmente melhor que a Eq. 10-83. Elas são equivalentes apenas se V = 0, isto é, para fluxos muito pequenos de número de Froude. Para V = 1, usando a Eq. 10-86, a difusividade hidráulica desaparece, enquanto este não é o caso da Eq. 10-83, para os quais a difusividade hidráulica permanece finita. 10.5 MÉTODO DE MUSKINGUM
O método Muskingum de propagação de inundação foi desenvolvido em conexão com projetos de proteção contra inundações na Bacia do Rio Muskingum, Ohio (Fig. 10-10) (McCarthy, 1938). É o método mais usado de propagação de inundações, com inúmeras aplicações nos Estados Unidos e em todo o mundo.
O método é baseado na equação diferencial de armazenamento (Fig. 10-11):
Em que: I = entrada;
Em um canal ideal, o armazenamento é uma função da entrada e saída. Isso está em contraste com um reservatório ideal, no qual o armazenamento é apenas uma função da vazão. No método Muskingum, o armazenamento é uma função linear de entrada e saída:
Em que: S = volume de armazenamento; Com entrada e saída em metros cúbicos por segundo e K em horas, o volume de armazenamento fica em (metros cúbicos por segundo)-hora. Como alternativa, K pode ser expresso em segundos, caso em que o volume de armazenamento está em metros cúbicos. Para derivar a equação de propagação de Muskingum, a Eq. 10-87 é discretizada no plano x-t (Fig. 10-12), para produzir:
A Eq. 10-88 é expressa nos níveis de tempo 1 e 2:
Substituindo as Eqs. 10-90 e 10-91 na Eq. 10-89, a partir da resolução de O2 obtem-se:
Em que C0, C1 e C2 são coefficientes de propagação definidos em termos de Δt, K, e X como consta a seguir:
Como C0 + C1 + C2 = 1, os coeficientes de propagação podem ser interpretados como coeficientes de ponderação. Dado um hidrograma de escoamento de entrada, uma condição de escoamento inicial, um intervalo de tempo escolhido Δt, e parâmetros de propagação X e K, os coeficientes de propagação podem ser calculados com a Eq. 10-93, e o hidrograma de saída com a Eq. 10-92. Os parâmetros de propagação X e K são relacionados às características do escoamento e do canal, sendo K interpretado como o tempo de viagem da onda de inundação da extremidade à montante até a extremidade à jusante do trecho do canal. Portanto, K é responsável pela parte da conversão do roteiro (Fig. 10-13). O parâmetro X é responsável pela parte de armazenamento da propagação. Para um determinado evento de inundação, existe um valor de X para o qual o armazenamento no hidrograma de vazão calculado corresponde ao do hidrograma de vazão medida. O efeito do armazenamento é reduzir o pico de fluxo e espalhar o hidrograma ao longo do tempo (Fig. 10-13). Portanto, é frequentemente usado de forma intercambiável com os termos difusão e atenuação de pico.
O parâmetro de propagação K é função do comprimento do trecho do canal e velocidade da onda de inundação. Por outro lado, o parâmetro X é função das características de fluxo e canal que causam a difusão do escoamento. No método Muskingum, X é interpretado como um fator de ponderação e restrito na faixa de 0 ≤ X ≤ 0,5. Valores de X maiores que 0,5 produzem amplificação hidrográfica (difusão negativa), que não corresponde à realidade (sob os números de Froude aplicáveis aos fluxos de inundação). Com K = Δt e X = 0,5, as condições de escoamento são tais que o hidrograma de saída mantém a mesma forma que o hidrograma do escoamento de entrada, mas é traduzido um tempo igual a jusante K. Para X = 0, o roteamento de Muskingum se reduz à propagação linear de um reservatório. No método Muskingum, os parâmetros K e X são determinados por calibração usando registros de fluxo. As medições simultâneas de vazão de entrada e saída para um determinado trecho do canal são acopladas a um procedimento de tentativa e erro, levando à determinação de K e X (consulte o Exemplo 10-1). O procedimento é demorado e carece de capacidade preditiva. Os valores de K e X determinados desta maneira são válidos apenas para o evento de alcance e inundação fornecido na calibração. A extrapolação para outros trechos ou para outros eventos de inundação (de magnitude diferente) dentro do mesmo trecho geralmente não é justificável. Quando dados suficientes estão disponíveis, uma calibração pode ser realizada para vários eventos de inundação, cada um com magnitude diferente, para cobrir uma ampla gama de níveis de inundação. Desta forma, a variação de K e X em função do nível de inundação pode ser verificada. Na prática, K é mais sensível ao nível de inundação do que X. Um esboço da variação de K com nível d'água e vazão é mostrado na Fig. 10-14.
O Exemplo 10-1 ilustrou o estágio preditivo do método Muskingum, no qual os parâmetros de propagação são conhecidos antes da propagação, propriamente dita. Se os parâmetros não forem conhecidos, é necessário primeiro executar uma calibração. O procedimento de tentativa e erro para calibrar os parâmetros de propagação é ilustrado pelo Exemplo 10-2.
A estimativa dos parâmetros de propagação é crucial para a aplicação do método Muskingum. Os parâmetros não são constantes, tendendo a variar com a vazão. Se os parâmetros de propagação puderem ser relacionados às características de escoamento e do canal, a necessidade de calibração por tentativa e erro será eliminada. O parâmetro K pode ser relacionado ao comprimento e velocidade da onda de inundação, enquanto X pode estar relacionado às características de difusividade do escoamento e canal. Essas proposições são a base do método Muskingum-Cunge. 10.6 MÉTODO DE MUSKINGUM-CUNGE
O método Muskingum requer uma calibração para identificar os parâmetros de propagação (Exemplo 10-2). O procedimento é baseado em hidrogramas de entrada e saída medidos, conforme mostrado nas Cols. 2 e 3 da Tabela 10-5. Portanto, uma estação de medição é uma necessidade absoluta para que o método Muskingum seja usado adequadamente. Isso limita a aplicação do método aos trechos que possuem uma estação de monitoramento de escoamento contínuo. Diferentemente do método Muskingum, o método Muskingum-Cunge requer dados hidráulicos, e não hidrológicos, para calcular os parâmetros de propagação. Os dados hidráulicos consistem em dados físicos, como inclinação do canal e características da seção transversal. Assim, o método Muskingum-Cunge não exige explicitamente uma estação de monitoramento do escoamento, sendo aplicável a qualquer trecho de canal desde que os dados físicos estejam disponíveis. O método Muskingum é obtido pela combinação da equação diferencial de armazenamento, ou seja, a equação de continuidade expressa na forma diferencial total (Eq. 10-87) com uma relação linear de entrada/saída/armazenamento (Eq. 10-88). Isso leva à equação de propagação de Muskingum (Eq. 10-92) com coeficientes de propagação adequados (Eq. 10-93). O método Muskingum-Cunge é derivado discretizando a equação da onda cinemática (Eq. 10-55) em um modo linear, de maneira semelhante à do método Muskingum, que leva à mesma equação de propagação. Os coeficientes, no entanto, são definidos com base nas características mensuráveis do canal. As semelhanças parecem terminar aí. O método Muskingum é agrupado através do trecho do canal, com base no armazenamento e é capaz de descrever a difusão das ondas de inundação (Exemplo 10-1). O método Muskingum-Cunge é distribuído, com dados especificados em seções transversais, e com base em uma discretização da equação da onda cinemática, que ostensivamente não se difunde. No entanto, cálculos reais usando o método Muskingum-Cunge mostram que ele é capaz de descrever a difusão de ondas, de maneira semelhante ao método Muskingum. Cunge (1969) traçou a difusão do analógico discretizado da equação da onda cinemática à difusão numérica do próprio esquema (ver quadro). Assim, ele foi capaz de explicar o paradoxo. Os métodos Muskingum e Muskingum-Cunge têm a mesma base teórica. Os parâmetros de propagação do método Muskingum são hidrológicos, baseados no armazenamento e determinados por calibração usando dados de escoamento. Os parâmetros de propagação do método Muskingum-Cunge são hidráulicos, distribuídos (em uma seção transversal) e baseados exclusivamente em dados físicos.
Equação de propagação Muskingum-Cunge Para derivar a equação de propagação de Muskingum-Cunge, a equação de onda cinemática (Eq. 10-55) é discretizada no planox-t (Fig. 10-17) de uma maneira que se assemelha ao método de Muskingum, centralizando a derivada espacial e descentralizando a derivada temporal por meio de um fator de ponderação X:
Em que: c = βV é a celeridade da onda cinemática.
Resolvendo a Eq. 10-94 para a vazão desconhecida leva à seguinte equação de propagação:
Os coeficientes de propagação são:
Definindo o tempo de viagem como:
Observa-se que os conjuntos de Eq. 10-93 e Eq. 10-96 são os mesmos. A Equação 10-97 confirma que K é de fato o tempo de viagem da onda de inundação, ou seja, o tempo que uma determinada vazão leva para percorrer o comprimento do trecho Δx com a celeridade da onda cinemática c. Propriedades numéricas
O número de Courant é definido como a razão entre a celeridade física (c) e a celeridade numérica ou em grade
A equação 10-95 é um análogo numérico da Eq. 10-55 e, portanto, sujeito à difusão e dispersão numérica. Difusão numérica é o erro de segunda ordem; dispersão numérica é o erro de terceira ordem. As seguintes condições são válidas:
Essas relações estão resumidas na Tabela 10-6.
Na prática, a difusão numérica pode ser usada para simular a difusão física da onda de inundação real. Ao expandir a função discreta Q (jΔx, n Δt)Q na série de Taylor sobre o ponto de grade (jΔx, n Δt), é obtido o coeficiente de difusão numérico do esquema de Muskingum (Cunge, 1969) (Apêndice B):
Na qual, νn é o coeficiente de difusão numérico do método de Muskingum. Esta equação revela o seguinte:
Uma equação preditiva para X pode ser obtida combinando à difusividade hidráulica νh (Eq. 10-83) com o coeficiente de difusão numérico do método de Muskingum νh (Eq. 10-99). Isso leva à seguinte expressão para X:
Com X calculado pela Eq. 10-100, o método Muskingum é referido como método Muskingum-Cunge. Assim, o parâmetro de propagação X pode ser calculado em função das seguintes propriedades numéricas e físicas:
Observa-se que a Eq. 10-100 foi derivada pela combinaç:ão da difusão física com a numérica (um processo de segunda ordem) e não é responsável pela dispersão (um processo de terceira ordem). Portanto, para simular a difusão de ondas adequadamente com o método Muskingum-Cunge, é necessário otimizar a difusão numérica (com as Eq. 10-100) e, ao mesmo tempo, minimizar a dispersão numérica mantendo o valor de C ≅ 1.
Uma versão melhorada do método Muskingum-Cunge é devida a Ponce e Yevjevich (1978). A difusividade da grade é definida como a difusividade numérica para o caso de X = 0. Da Eq. 10-99, a difusividade da grade é:
A célula Reynolds número D é definida como a razão de difusividade hidráulica (Eq. 10-83) para difusividade da grade (Eq. 10-101). Isto leva a:
Assim sendo:
As Eqs. 10-101 e 10-102 implicam que, para valores muito pequenos de Δx, D pode ser maior do que 1, levando a valores negativos de X. De fato, para o comprimento do trecho característico, o número de Reynolds célula é D = 1 e X.
Assim sendo, no método de Muskingum-Cunge, comprimentos de trechos mais curtos do que o comprimentodo trecho característica resultam em valores negativos de X. Isso deve ser contrastado com o método clássico de Muskingum (Seção 10.4), no qual X é restrito na faixa de 0,0 ≤ X 0,5. No Muskingum clássico, X é interpretado como um fator de ponderação. Como mostrado pelas Eqs. 10-101 e 10-102, os valores não negativos de X estão associados a trechos longos, típicos de cálculos manuais usados no desenvolvimento e na aplicação precoce do método Muskingum. No método Muskingum-Cunge, no entanto, X é interpretado de forma combinada ao momento ou como fator combinado à difusão. Portanto, valores negativos de X são inteiramente possíveis. Esse recurso permite o uso de trechos mais curtos do que seria possível se X fosse restrito aos valores não negativos. Coeficientes de propagaçãoA substituição das Eqs. 10-98 e 10-100 na Eq. 10-96 leva a coeficientes de propagação expressos em termos de números de Courant e de de Reynolds:
O cálculo dos parâmetros de propagação C e D pode ser realizado de várias maneiras. A celeridade das ondas pode ser calculada com a Eq. 10-57 ou Eq. 10-59. Com Eq. 10-57, c = βV; with Eq. 10-59, c = (1/T) dQ/dy. Teoricamente, essas duas equações são iguais. Para aplicações práticas, se houver dados sobre a curva-chave e geometria da seção transversal (ou seja, tabelas da largura do topo da vazão e nível d'água), a Eq. 10-59 é preferível do que a Eq. 10-57, porque responde diretamente pelo formato da seção transversal. Na ausência de uma curva-chave e de dados tda seção, a Eq. 10-57 pode ser usada para estimar a celeridade das ondas de inundação. Com a ajuda de Eqs. 10-98 e 10-102, os parâmetros de propagação podem ser baseados nas características do escoamento. Os cálculos podem prosseguir de modo linear ou não linear. No modo linear, os parâmetros de propagação são baseados em valores de fluxo de referência e mantidos constantes durante todo o cálculo no tempo. A escolha do fluxo de referência influencia os resultados calculados, embora o efeito geral seja pequeno (Ponce e Yevjevich, 1978) Para aplicações práticas, um valor de fluxo médio ou de pico pode ser usado como fluxo de referência. O valor do pico de fluxo tem a vantagem de poder ser prontamente determinado, embora uma melhor aproximação possa ser obtida usando um valor médio. O modo linear de computação é referido como o método Muskingum-Cunge de parâmetro constante para distingui-lo do método Muskingum-Cunge de parâmetro variável, no qual os parâmetros de propagação podem variar com o fluxo. O método de parâmetro constante se assemelha ao método de Muskingum, com a diferença de que os parâmetros de propagação são baseados em características mensuráveis do fluxo e do canal, e não em dados históricos de fluxo.
Requisitos de resolução Ao usar o método Muskingum-Cunge, deve-se tomar cuidado para garantir que os valores de Δx e Δt sejam suficientemente pequenos para se aproximarem da forma real do hidrograma. Para hidrogramas em subida suave, é recomendado um valor mínimo de tp /Δt = 5. Esse requisito geralmente resulta na resolução da base de tempo do hidrograma em pelo menos 15 a 25 pontos discretos, considerados adequados para a propagação de Muskingum. Diferentemente da resolução temporal, não há critérios definidos para a resolução espacial. Um critério confirmado pela experiência baseia-se no fato de que os números de Courant e da célula de Reynolds estão inversamente relacionados ao comprimento do trecho Δx. Portanto, para manter Δx suficientemente pequeno, os números de Courant e da célula de Reynolds devem ser mantida suficientemente grandes. Isso leva ao critério prático (Ponce e Theurer, 1982):
A Eq. 10-106 também pode ser escrita da seguinte forma: -1 + C + D ≥ 0. Isso confirma a necessidade de evitar valores negativos de C 0 no propagação Muskingum-Cunge (consulte a Eq. 10-105a). A experiência mostrou que valores negativos de C1 or C2 não afetam adversamente a precisão geral do método. Não obstante a Eq. 10-106, o método Muskingum-Cunge funciona melhor quando a dispersão numérica é minimizada, ou seja, quando C ≅ 1. Valores de C substancialmente menores que 1 provavelmente causam quedas notórias, ou saídas negativas, em porções do hidrograma calculado. Essa anomalia computacional é atribuída à dispersão numérica excessiva e deve ser evitada. Método não linear de Muskingum-Cunge A equação da onda cinemática, Eq. 10-55, não é linear porque a celeridade da onda cinemática varia com a vazão. A não linearidade é leve, entre outras coisas, porque a variação da celeridade das ondas geralmente é restrita dentro de uma faixa estreita. No entanto, em certos casos, pode ser necessário considerar essa não linearidade. Isso pode ser feito de duas maneiras: (1) durante a discretização, permitindo que a celeridade das ondas varie, resultando em um esquema numérico não linear a ser resolvido por meios iterativos; e (2) após a discretização, variando os parâmetros de propagação, como no método de parâmetro variável Muskingum-Cunge (Ponce e Yevjevich, 1978. A última abordagem é particularmente útil se o efeito não linear geral for pequeno, o que geralmente ocorre. O método Muskingum-Cunge do parâmetro variável representa uma melhoria pequena, mas às vezes perceptível, em relação ao método de parâmetro constante. As diferenças provavelmente são mais acentuadas para trechos muito longos e/ou grandes variações nos níveis de escoamento. Os hidrogramas de inundação calculados com parâmetros variáveis mostram uma certa distorção, seja a declividade das ondas, no caso de fluxos contidos nas margens ou com a atenuação das ondas (achatamento) no caso dos fluxos típicos de transbordamento das margens. Esta é uma manifestação física do efeito não linear, ou seja, diferentes níveis de fluxo viajando com diferentes celeridades. Por outro lado, os hidrogramas de inundação calculados usando parâmetros constantes não mostram distorção das ondas. Avaliação do método Muskingum-Cunge O método Muskingum-Cunge é uma alternativa baseada fisicamente ao método Muskingum. Ao contrário do método Muskingum, onde os parâmetros são calibrados usando dados de fluxo, no método Muskingum-Cunge os parâmetros são calculados com base nas características do fluxo e do canal. Isso possibilita o propagação de canais sem a necessidade de calibração de parâmetros de forma complexa por um longo período de tempo. Mais importante, torna possível a propagação extensiva de canais em fluxos não monitorados com uma expectativa razoável de precisão. Com o recurso de parâmetro variável, propriedades não lineares das ondas de inundação (que só poderiam ser obtidas por meio de procedimentos numéricos mais elaborados) podem ser descritas no contexto da formulação de Muskingum. Como o método Muskingum, o método Muskingum-Cunge é limitado para ondas de difusão. Além disso, o método Muskingum-Cunge é baseado em uma classificação de valor único e não leva em conta a não-uniformidade do fluxo elevado ou os fluxos instáveis, mostrando laços (loops) substanciais na classificação da curva-chave (como exemplo, as ondas dinâmicas). Assim, o método Muskingum-Cunge é adequado para a propagação de canais em riachos naturais sem efeitos significativos de remanso e para fluxos instáveis que se classificam sob o critério de ondas de difusão (Eq. 10-66). Uma diferença importante entre os métodos Muskingum e Muskingum-Cunge deve ser observada. O método Muskingum é baseado no conceito de armazenamento (Eq. 10-87) e, portanto, é agrupado, com os parâmetros K e X sendo as médias dos trechos. O método Muskingum-Cunge, no entanto, é distribuído na natureza, com os parâmetros C e D baseados nos valores avaliados nas seções transversais do canal. Portanto, para que o método Muskingum-Cunge melhore o método Muskingum, é necessário que os parâmetros de propagação avaliados nas seções transversais do canal sejam representativos do alcance do canal em consideração (Fig. 10-18). Historicamente, o método Muskingum foi calibrado usando dados de fluxo. Pelo contrário, o método Muskingum-Cunge baseia-se em características físicas como curvas-chave, dados da seção transversal e declividade do canal. Os diferentes requisitos de dados refletem as diferentes bases teóricas dos métodos, ou seja, o conceito de armazenamento concentrado no método Muskingum e a teoria da onda cinemática / difusão distribuída no método Muskingum-Cunge.
10.7 ONDAS DINÂMICAS
No fluxo instável de canal aberto, o termo onda dinâmica é usado para se referir a dois tipos diferentes de ondas:
Para evitar confusão, o primeiro tipo de onda [3] é referido aqui como uma verdadeira onda dinâmica. O segundo tipo [5] é chamado de onda cinemático-dinâmica mista, para ondas dinâmicas mistas curtas. Ondas dinâmicas verdadeiras Conceitualmente, as verdadeiras ondas dinâmicas são exatamente o oposto das ondas cinemáticas. Enquanto as ondas cinemáticas estão do lado esquerdo do espectro do número de onda, as verdadeiras ondas dinâmicas estão do lado direito (Fig. 10-3). Assim, seu número de onda adimensional é longo, ou seja, o comprimento de onda L é curto em relação ao comprimento do canal de referência Lo (Eq. 10-30). Enquanto a celeridade relativa adimensional de uma onda cinemática é constante e igual a 0,5, a da onda dinâmica verdadeira é igual à recíproca do número de Froude (Fig. 10-3):
A celeridade relativa de uma verdadeira onda dinâmica é:
A celeridade de uma verdadeira onda dinâmica é:
Portanto, uma verdadeira onda dinâmica possui dois componentes, com celebridades:
As ondas cinemáticas e dinâmicas verdadeiras compartilham uma propriedade distinta: elas não atenuam. Isso ocorre devido à constância da celeridade relativa da onda adimensional dentro da faixa aplicável de número de onda adimensional (Fig. 10-3). Na prática, ondas dinâmicas verdadeiras se aplicam às ondas curtas que podem estar presentes em canais de laboratório e pequenos canais. Eles não se aplicam às ondas de inundação, que ficam no lado esquerdo do espectro de número de onda adimensional. Ondas dinâmicas mistas As ondas cinemático-dinâmicas mistas , para ondas dinâmicas mistas curtas, ficam no meio do espectro do número de onda (Fig. 10-3). Conceitualmente, são o tipo mais completo de onda, porque consideram todos os termos da equação do movimento (Tabela 10-2). No entanto, para os números Vedernikov V < 1, (correspondentes aos números Froude F < 2 sob atrito Chezy em canais hidraulicamente amplos), as ondas dinâmicas mistas estão sujeitas à forte atenuação. A atenuação é mais forte no ponto de inflexão da celeridade relativa adimensional versus a função de número de onda adimensional (Fig. 10-4). A Fig. 10-5 mostra as taxas de atenuação, conforme descrito pelo decréscimo logarítmico δ. Lighthill e Whitham (1955) descreveram a impermanência de ondas dinâmicas [mistas] nos seguintes termos:
Eles seguiram com esta afirmação (op. cit., page 291):
Assim, em geral, as ondas dinâmicas mistas não se aplicam aos fluxos de inundação em córregos naturais. Uma vez geradas, as ondas dinâmicas mistas tendem a se dissipar muito rapidamente, com sua massa se unindo à onda cinemática ou de difusão subjacente predominante. A exceção pode ser uma onda de inundação gerada por uma brecha na barragem, que geralmente é tão repentina que pode ser efetivamente uma onda dinâmica mista. Essas ondas atenuam-se muito rapidamente, confirmando a correção da teoria. Por exemplo, considere a falha da barragem de Teton, em Idaho, em 5 de junho de 1976 (Fig. 10-19). A onda de inundação liberada no local da barragem atenuou uma pequena fração de sua força inicial (menos de 3%) a uma distância relativamente curta à jusante. Muitos outros exemplos de violações reais de barragens confirmaram que as ondas de inundação tendem a se dissipar rapidamente.
Em relação à solução de uma onda dinâmica, as equações de continuidade e movimento são resolvidas por um procedimento numérico, (a) o método das diferenças finitas, (b) o método das características ou (c) o método dos elementos finitos. No método das diferenças finitas, as equações diferenciais parciais são discretizadas seguindo um esquema numérico escolhido. O método das características baseia-se na conversão do conjunto de equações diferenciais parciais em um conjunto relacionado às equações diferenciais ordinárias e na solução ao longo de uma grade característica, isto é, uma grade que segue as direções características. O método dos elementos finitos resolve um conjunto de equações integrais sobre uma grade escolhida de elementos finitos. Nas últimas quatro décadas, o método das diferenças finitas passou a ser considerado a maneira mais conveniente de obter uma solução de ondas dinâmicas mistas para aplicações práticas. Entre vários métodos numéricos que foram usados em conexão com a onda dinâmica mista, a abordagem de Preissmann é provavelmente a mais popular (Liggett e Cunge, 1975). Este é um esquema de quatro pontos, centrado nas derivadas temporais e ligeiramente descentralizado nas derivadas espaciais, pelo uso de um fator de ponderação θ. A descentralização nas derivadas espaciais introduz uma pequena quantidade de difusão numérica necessária para controlar a estabilidade numérica do esquema não linear. Isso produz um esquema viável, mas suficientemente preciso.
As variáveis independentes usadas na propagação dinâmica de ondas mistas são geralmente a vazão Q e
Na prática, uma solução mista de ondas dinâmicas representa um aumento de ordem de magnitude na complexidade e nos requisitos de dados associados quando comparados às soluções de ondas cinemáticas ou de difusão. Seu uso é recomendado nas situações em que nem as soluções de ondas cinemáticas nem de difusão provavelmente representam adequadamente os fenômenos físicos. Particularmente, as soluções de ondas dinâmicas mistas são aplicáveis para as ondas de inundação de rompimento de barragens, vazão em encostas muito planas, vazão em grandes reservatórios, condições de marés fortes e reversões de vazão. Em geral, a onda dinâmica mista é recomendada para casos que garantam uma determinação precisa da variação instável dos estágios (níveis d'água) do rio. A versão atual (Versão 5.0.7) do modelo HEC-RAS (US Army Corps of Engineers, 2020) contém um módulo de ondas dinâmicas adequado para aplicações práticas. Curva de classificação dinâmica mistaSoluções de ondas dinâmicas mistas são frequentemente chamadas de propagação hidráulicao de rios. Como tal, eles têm a capacidade de calcular descargas e estágios instáveis quando apresentados com os dados de canal geométrico apropriados e condições iniciais e de contorno. Sua importância no fluxo instável é examinada aqui, comparando-as com ondas cinemáticas e de difusão. As ondas cinemáticas calculam descargas instáveis; os estágios correspondentes são subsequentemente obtidos a partir das curvas de classificação apropriadas. Curvas de classificação de equilíbrio (constante, uniforme) são usadas para essa finalidade. Ondas de difusão podem ou não usar curvas de classificação de equilíbrio para calcular os estágios. Alguns métodos, por exemplo, Muskingum-Cunge, usam classificações de equilíbrio, mas soluções de ondas de difusão mais elaboradas não podem. As ondas dinâmicas mistas dependem da física dos fenômenos incorporada nas equações que governam para gerar sua própria taxa de fluxo instável. Uma curva-chave em loop é produzida em cada seção transversal, como mostrado na Fig. 10-21. Para qualquer estágio, a vazão é maior no membro ascendente do hidrograma e menor no membro decrescente. Esse loop é devido a razões hidrodinâmicas e não deve ser confundido com outros loops, que podem ser causados por erosão, sedimentação ou alterações na configuração do leito.
A largura do loop é uma medida da instabilidade do fluxo, com loops mais largos correspondendo a um fluxo altamente instável. Se o loop for estreito, isso implica que o fluxo é levemente instável, sendo provavelmente uma onda de difusão. Se o loop for praticamente inexistente, o fluxo pode ser aproximado como fluxo cinemático. De fato, a suposição básica do fluxo cinemático é de que o momento pode ser simulado como fluxo uniforme constante, ou seja, que a curva de classificação é de valor único. As observações anteriores levam à conclusão de que a importância das ondas dinâmicas mistas está diretamente relacionada à instabilidade do fluxo e ao loop associado na curva-chave. Para fluxos altamente instáveis, como ondas de inundação de barragens, pode muito bem ser a única maneira de contabilizar adequadamente a curva em loop. Para outros fluxos menos instáveis, as ondas cinemáticas e de difusão são uma alternativa viável, desde que a sua aplicação (Eqs. 10-67 e 10-84, respectivamente) possa ser claramente demonstrada. Condição de contorno à jusanteA modelagem de uma onda dinâmica mista apresenta um paradoxo interessante: para resolver o problema corretamente, uma condição de contorno dinâmico à jusante (geralmente uma curva-chave) deve ser especificada. No entanto, uma condição de contorno à jusante dinâmica não é conhecida a priori . Segundo Abbott (1976):
Uma saída para essa dificuldade é estender artificialmente o canal em város subtrechos à jusante e especificar uma curva cinemática no limite à jusante recém-definido, dando ao loop a chance de se desenvolver na seção transversalà montante de interesse (Fig. 10-22) Ponce e Lugo (2001) usaram análise de sensibilidade para mostrar que a extensão artificial do canal por uma quantidade igual ao comprimento do canal (ou seja, dobrando o comprimento do canal) pode ser suficiente para produzir uma curva precisa do loop na seção de interesse.
QUESTÕES
PROBLEMAS
REFERÊNCIAS
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